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21/12/2021 14:02

Estudo avalia uso de evidência científica por dirigentes da burocracia federal


Pesquisa confirma e amplia resultados obtidos em 2019

Os desafios para ampliação do uso de conhecimento científico na administração pública federal estão mais do lado da ausência de mecanismos e processos dentro das organizações que demonstrem ou incentivem a melhor utilização de evidências do que da falta ou escassez de capacidades individuais ou de produção científica sobre os problemas da sociedade brasileira. Esse foi o principal obstáculo apontado por 63% dos respondentes da pesquisa que resultou na publicação “Uso de Evidências pela Burocracia Dirigente do Nível Federal”, divulgada nesta terça-feira (21/12), pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). O estudo buscou traçar uma radiografia do uso de evidências por esse grupo do alto escalão federal, a partir de um survey aplicado entre novembro de 2020 e janeiro de 2021.

A análise explora condicionantes e finalidades do uso de evidências científicas pelos burocratas dirigentes em comparação com os resultados do survey feito em 2019 (Texto para Discussão 2.619) com a burocracia geral dos ministérios, ou seja, ocupantes ou não de cargos de direção e assessoramento (DAS). Do survey atual participaram 787 ocupantes de DAS, níveis 4, 5 e 6 e correlatos, em órgãos da administração direta e indireta. O universo de pesquisa abrangeu 6.475 servidores, dos quais 12% responderam o questionário, que inovou em sua metodologia ao incorporar experimentos de survey, por meio de perguntas aleatórias a diferentes grupos de respondentes de modo a ampliar a percepção sobre esse público. Os servidores dedicaram meia hora do seu tempo para responder cerca de 50 questões sobre o uso de evidências científicas na tomada de decisão acerca de políticas públicas.

“O padrão identificado no survey anterior se manteve no atual, o que consolida as informações e achados dos dois estudos”, disse o pesquisador do Ipea, Pedro Palotti, um os autores da publicação. “Embora o grupo de dirigentes utilize mais evidências científicas do que aquele de nível médio focado no survey anterior, a fonte informacional mais relevante para a burocracia dirigente está relacionada àquelas internas, produzidas pelo próprio Estado”, observou. Enquanto 41% afirmaram que utilizam frequentemente ou sempre pesquisas científicas, no caso das fontes internas, 94% disseram que sempre ou frequentemente recorrem a elas.

O estudo identificou quatro grupos de tipos de informação usados pelos burocratas dirigentes. São eles: o grupo que usa informações provenientes da própria máquina pública, ou fontes internas, que englobam legislação, base de dados administrativos, entre outros, do próprio governo; outro de fontes externas não científicas muitas vezes resultantes de recomendações de organismos internacionais ou de instâncias participativas, além da imprensa e grupos de interesse que prestam informações para a tomada de decisão; mais um de fontes externas científicas – artigos, periódicos e capítulos de livros; e outro que recorre a fontes experienciais, da própria experiência dos respondentes ou da interlocução com os colegas de trabalho.

“Ao comparar os dois grupos pesquisados, chama atenção o fato de o burocrata dirigente usar mais todos os tipos de fontes informacionais”, destacou Natália Koga, coautora da publicação junto com Bruno Gontyjo do Couto, Maricilene Isaira Baia do Nascimento e Rafael da Silva Lins. Assim, 62% dos burocratas médios disseram usar notas técnicas sempre ou frequentemente para subsidiar seus trabalhos e, no caso dos dirigentes, essas fontes atingem 80%. Já os artigos científicos, enquanto são utilizados em alta frequência por 30% dos burocratas médios, no grupo de dirigentes 40% recorriam a essa fonte na mesma frequência, revelou a pesquisadora do Ipea. “Dessas fontes, outro resultado que chama muita atenção são as recomendações dos órgãos de controle e dos pareceres judiciais que apresentaram alta frequência de uso em cerca de 50% do grupo geral de burocratas e do grupo de burocratas dirigentes, 70%”, revelou Koga.

“É preciso entender melhor como as capacidades analíticas individuais se relacionam com as capacidades organizacionais”, avaliou Palotti. A burocracia dirigente, segundo ele, tem um elevado nível de qualificação, pois a maioria tem doutorado, pós-graduação ou mestrado, e se capacitam recorrentemente. “A questão agora é entender como o uso de evidências científicas é motivado pelas próprias organizações, já que identificamos que não há muitos mecanismos e processos organizacionais para se aperfeiçoar o uso de evidências científicas”, acrescentou.

Não é possível afirmar que uma evidência vai ser decisiva ou a mais adequada, se não se entende qual é o processo de tomada de decisão, avalia o pesquisador. “É importante compreender qual é a moldura contextual para analisar o uso de informações”, destacou Palotti, ao ressaltar que o estudo é parte de um projeto mais amplo com outras publicações de colegas do Ipea, como a do pesquisador Maurício Pinheiro que discute os conceitos de evidências e moldura contextual (TD 2554). Também é fundamental entender o aspecto relacional dos burocratas, assinalou. “Individualmente, eles possuem uma elevada educação formal, são capacitados com relativa frequência, mas é preciso compreender como é que as organizações mobilizam esses burocratas internamente e como elas motivam o uso de evidências”, pontuou.

Do ponto de vista dos indivíduos as coisas vão relativamente bem, mas do lado das organizações há muita variação e uma assimetria acentuada entre os órgãos da administração pública federal na mobilização e na utilização de evidências, no incentivo aos próprios burocratas a utilizar evidências e na mobilização que eles fazem de diferentes evidências, avaliou Palotti. “É importante compreender qual é a necessidade do uso de evidências pelo dirigente no processo de tomada de decisão, a partir das necessidades do contexto em que ele atua”, completou Koga.

A interação dos burocratas dirigentes também é um aspecto a ser aprofundado, segundo a pesquisadora, pois esse grupo atua mais em intermediação, negociação, comunicação. Daí eles interagirem mais com os atores de políticas públicas, havendo maior incidência, inclusive, no controle da produção da política pública. Também no campo científico, o burocrata dirigente interage mais com a comunidade científica, se comparado ao burocrata médio. “É uma perspectiva importante, principalmente para definir quais ações adotar, e incentivar frente ao desafio de trazer mais conhecimento científico para a administração pública”, disse Koga. Para ela, esse burocrata que já tem a função de intermediação e um nível de instrução mais elevado, talvez possa ser estimulado e mais bem preparado para atuar como intermediário do conhecimento científico.

Outro aspecto observado pelos pesquisadores é a governança das evidências, pois não basta o burocrata dirigente ter capacidade individual para usar o conhecimento científico; é preciso existir um arranjo institucional ou das capacidades institucionais, do ponto de vista dos incentivos e das institucionalidades, como unidades organizacionais, mecanismos e instrumentos, para que possam alavancar o uso de sua capacidade individual. Essa é outra contribuição do estudo: apontar caminhos para se entender mais sobre o melhor uso do conhecimento científico e sobre as fontes informacionais. “Inclusive, a falta de conexão com as manifestações da sociedade, por meio de ouvidorias e recomendações de instâncias participativas, que nesse caso se demonstrou baixíssima, como já verificado no survey anterior”, disse Koga.

A publicação preliminar foi produzida em parceria com a Universidade Federal de Pernambuco e com subsídios de vários pesquisadores do Ipea e de outras organizações – como o Institute of Development Studies (IDS), do Reino Unido –, que participaram do primeiro survey. Os pesquisadores do Ipea propõem aprofundar o exame das organizações públicas e como elas se estruturam ou não para lidar com evidências e o papel que as organizações têm no sentido de ampliar o uso de evidências científicas e torná-las mais adequadas ao processo decisório. Outro aspecto de continuidade seria compreender o contexto dos analistas de políticas públicas no processo decisório e na implementação das políticas públicas, além de um livro reunindo diversos artigos sobre essa temática, previsto para 2022.

Confira a íntegra da Publicação Preliminar.

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