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07/07/2020 18:42

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Diagnóstico da Inserção dos Jovens Brasileiros no Mercado de Trabalho em um Contexto de Crise e Maior Flexibilização


Equipe Técnica: Carlos Henrique Leite Corseuil, Katcha Poloponsky e Maira Penna Franca
 

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O Brasil passou por transformações importantes a partir de 2015, que tiveram impactos fortes no mercado de trabalho e que apresentam implicações significativas para a inserção dos jovens em termos quantitativos e qualitativos. No intuito de identificar as principais tendências da juventude brasileira no mercado de trabalho, passando de um contexto de crescimento para um contexto de crise e maior flexibilização, este texto se baseia em dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio Contínua (PNAD Contínua), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), do período do primeiro trimestre de 2012 ao primeiro trimestre de 2019, complementados pela Relação Anual de Informações Sociais (Rais), da Secretaria de Previdência e Trabalho do Ministério da Economia, de 2012 a 2017. Trata-se de um estudo inovativo por dois motivos principais: além de apresentar uma atualização importante de dados sobre a evolução dos indicadores laborais do público-alvo dos jovens, o estudo adotou a abordagem de utilizar indicadores que retratam os fluxos (em vez de estoques) de jovens no mercado de trabalho. Assim, pretende-se apresentar um diagnóstico atual e informativo para estudiosos e formuladores de políticas públicas.

Na última década, foram produzidos muitos estudos com o intuito de analisar as tendências de inserção dos jovens no mercado de trabalho brasileiro. Entre outros, cabe aqui um destaque para os estudos de Constanzi (2009) e Corseuil e Franca (2015), ambos comissionados pelo escritório da Organização Internacional do Trabalho (OIT) no Brasil. A grande maioria desses estudos trazem duas características. Em primeiro lugar, são baseados em informações que se estendem, no máximo, até a primeira metade da última década. No entanto, a conjuntura econômica mudou radicalmente após 2015, com a taxa de desemprego saltando de 7,9% para 13,7% entre os primeiros trimestres de 2015 e 2017. Esse novo contexto, por si só, já motiva uma análise com informações mais atuais.

Além disso, entre 2017 e 2018, foi implementada uma série de importantes alterações na legislação trabalhista, no sentido de incrementar o grau de flexibilização das relações trabalhistas. Em particular, vale ressaltar a maior facilidade conferida à prestação de serviço às empresas por terceiros. A isso se soma o surgimento de novas tecnologias, entre as quais também se destacam tecnologias associadas à prestação de serviços (aplicativos). Entende-se que o conjunto desses fatores e outros contribuiu para um crescimento expressivo de ocupações por conta própria nos últimos anos, que, em grande parte, foi puxado por trabalhadores desse segmento envolvidos em atividades afetadas pelo uso de aplicativos, tais como os setores de transporte terrestre e serviços de entrega (Ipea, 2020).

Em suma, o cenário no mercado de trabalho, na segunda metade da última década, foi afetado por uma escassez de oportunidades de trabalho e uma realocação das oportunidades existentes. Tal transformação no mercado de trabalho configura, portanto, uma primeira motivação para uma nova análise do panorama dos jovens nesse ambiente.

Em suma, o cenário no mercado de trabalho, na segunda metade da última década, foi afetado por uma escassez de oportunidades de trabalho e uma realocação das oportunidades existentes. Tal transformação no mercado de trabalho configura, portanto, uma primeira motivação para uma nova análise do panorama dos jovens nesse ambiente.

Uma segunda motivação para uma nova análise do panorama dos jovens no mercado de trabalho reside no fato de que os estudos prévios tendem a ser baseados em indicadores que retratam estoques, em detrimento aos fluxos.2 É sabido, no entanto, que os indicadores de estoque podem se mover timidamente mesmo quando há uma rica dinâmica de realocação de trabalhadores e postos de trabalho. Mesmo quando os indicadores de estoque mostram movimentos pronunciados, os indicadores de fluxo podem se revelar muito úteis para compreender os determinantes desses movimentos. Motivada por esses fatos, uma abordagem baseada em análise dos fluxos de trabalhadores (ou transições) vem ganhando cada vez mais espaço na literatura especializada (notadamente, após a publicação do estudo de Blanchard e Diamond, 1992).

A recente disponibilização de dados longitudinais da PNAD Contínua possibilita esse tipo de análise baseada em fluxos com cobertura para todo o território nacional e todos os tipos de vínculos empregatícios.3 Nossa análise empírica faz extenso uso dos dados da PNAD Contínua para o período de 2012 até o primeiro trimestre de 2019. De forma complementar, utilizaremos também os dados da Rais para o período 2012-2017. Os dados da Rais também são longitudinais e permitem extrair informações mais detalhadas a respeito da empresa onde o trabalhador se emprega. Entretanto, a cobertura da Rais se restringe ao setor formal.

Conforme já mencionado, o período a ser analisado compreende uma forte aceleração das taxas de desemprego. Os jovens são apontados como o grupo cuja respectiva taxa de desemprego possui maior sensibilidade ao ciclo econômico. Zanin (2015) provê evidências empíricas com dados de 33 países no âmbito da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), corroborando essa maior sensibilidade da taxa de desemprego dos mais jovens.

Porém as causas para essa maior sensibilidade não são consenso na literatura. Alguns estudos apontam para o fato de os jovens, quando empregados, terem menos acúmulo de capital humano e menos proteção contra demissão (O’Higgins, 1997; Bell e Blanchflower, 2011; Dunsch, 2016). De forma complementar, Huckfeldt (2018) indica um aumento no nível de exigência dos empresários para contratações em períodos de crise como outro fator relevante para a maior sensibilidade da taxa de desemprego dos jovens. Essa maior exigência, sobretudo quando aplicada à dimensão de experiência, tende a reduzir muito as contratações de jovens em períodos de crise, contribuindo para uma maior duração do desemprego dos jovens, a qual, por sua vez, impulsiona as taxas de desemprego dos jovens nessas ocasiões. Vários resultados que apresentaremos nas próximas seções são compatíveis com esse diagnóstico.

O diagnóstico da inserção dos jovens no mercado de trabalho está dividido em quatro seções, sendo a primeira esta introdução. A seção 2 contextualiza a conjuntura do mercado de trabalho brasileiro entre 2012 e 2019, com um foco no aumento do desemprego dos jovens e seus determinantes entre 2015 e 2017. Para complementar, exploraremos o caráter longitudinal da PNAD Contínua com uma análise dos fluxos de entrada e saída do desemprego. Nessa seção, fica clara a maior retenção dos jovens no estado de desemprego como um importante determinante no aumento do desemprego dos jovens. A seção 3 busca caracterizar como se altera a composição do emprego dos jovens no período de aceleração das taxas de desemprego. Para tanto, investigamos aspectos qualitativos da ocupação dos jovens – como o nível de informalidade, o tipo de contrato de trabalho, os rendimentos e a jornada – e algumas características das firmas em que os jovens estão inseridos, como o tamanho da empresa e o setor de atividade. Nossos resultados apontam uma piora na qualidade da ocupação dos jovens em todas as dimensões investigadas quando se comparam os anos após o aumento do desemprego (2017 em diante) com os anos anteriores ao aumento do desemprego (antes de 2015). A seção 3 traz também análises dos fluxos de fora do emprego para o emprego informal e formal e transições para o emprego formal por tipo de vínculo e tamanho da empresa. Nesse quesito em particular, é nítido que a piora na qualidade da ocupação se deve, em boa medida, aos jovens que estavam sem ocupação e ingressaram em ocupações de qualidade inferior. Por último, na seção 4, investigamos a conciliação entre as atividades de estudo e trabalho dos jovens brasileiros, com foco nos jovens que não estão ocupados e não estudam, o chamado nem-nem ou sem-sem.

Devido à grande heterogeneidade entre os jovens, sempre que possível, os dados serão desagregados segundo algumas características individuais. Desagregações por gênero, escolaridade e por faixa etária (15 a 17, 18 a 24 e 25 a 29 anos) estarão sempre presentes nos indicadores listados anteriormente.

Por fim, vale ressaltar que nossa análise não cobre o período no qual o país foi severamente afetado pela pandemia da Covid-19, notadamente março de 2019. O principal motivo para tal fato é a indisponibilidade de dados para esse período. Os dados da PNAD Contínua são agrupados por trimestre e divulgados dois meses depois do trimestre de referência. Logo, os dados do primeiro trimestre de 2020 só devem ser divulgados no final de maio. Mesmo esses dados referentes ao primeiro trimestre podem ser pouco informativos, haja vista que as medidas de precaução à Covid-19 começaram a ser implementadas nos primeiros estados em meados de março, ou seja, na última das seis quinzenas compreendidas nesse período. Os dados referentes ao segundo trimestre de 2020 devem ser bem mais informativos sobre o impacto da pandemia em relação ao mercado de trabalho brasileiro, em particular sobre a inserção dos jovens neste. No entanto, esses dados só devem ser disponibilizados em agosto.

Ademais, a nossa análise da inserção dos jovens no mercado de trabalho brasileiro, centrada no forte aumento do desemprego observado entre 2015 e 2017, pode ser bastante informativa sobre os impactos da Covid-19, haja vista que se trata de um choque de natureza semelhante no que diz respeito a uma forte contração na demanda, que deve levar a uma outra forte aceleração no desemprego.

Diagnóstico da Inserção dos Jovens Brasileiros no Mercado de Trabalho em um Contexto de Crise e Maior Flexibilização

 

 
 

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